Durante o evento Encha o seu Kindle, realizado pela Íris em parceria com a Amazon em 2025, entre milhares de ebooks disponíveis, duas obras chamaram atenção e geraram grandes discussões sobre o que é um livro bom ou ruim. Esses debates revelam que classificar um livro de forma simplista como “bom” ou “ruim” não faz justiça à complexidade da literatura. Afinal, o que torna um livro bom?
Antes de mais nada, preciso esclarecer que há critérios para definir a qualidade literária, aspectos que ajudam a refletir um livro bem construído. Entre os principais, destaque-se:
- Complexidade formal e estrutural: enredos robustos, personagens profundos, narrativa coesa, jogos linguísticos e inovações.
- Ambiguidade e múltiplos sentidos: obras que não se esgotam em uma única leitura e que continuam a dominar reflexões diversas.
- Força estética da linguagem: escrita refinada, ritmo envolvente, vocabulário bem escolhido e uso inteligente de figuras de linguagem.
- Dimensão humana e existencial: tratamento de temas universais, como amor, morte, tempo, culpa e desejo, com profundidade e afastamento de clichês.
-Capacidade de resistir ao tempo: livros que continuam atuais e relevantes apesar do passar dos anos, ultrapassando contextos e geografia.
Porém, dentro dessa concepção de “bom livro” cabe considerar as diversas categorias de leitura: aquelas que convidam ao desafio intelectual, tirando o leitor do conforto cotidiano; aqueles que promovem leveza e acolhimento; e aqueles que são projetados especificamente para o lazer e distração.
Na discussão foi levantada que livros bons precisam ter um aprendizado, mas esquecem que o conforto e lazer precisam andar juntos. É fundamental olhar para critérios que proporcionem uma experiência literária rica e equilibrada, antes de mais nada:
- Avalie o conteúdo e o estilo: Busque obras que tragam reflexões e informações valiosas, mas que também sejam acessíveis e proporcionem conforto, com uma narrativa envolvente que evite tornar a leitura cansativa.
- Considere seu momento e interesse: Opte por leituras densas e teóricas em períodos de foco intelectual, livros acolhedores em momentos de relaxamento emocional e obras com ritmo para diversão.
-Explore gêneros híbridos e autores desconhecidos: Muitas obras combinam riqueza temática com narrativa cativante. Aproveite recomendações que equilibrem profundidade e prazer.
- Diversifique a leitura: intercale entre vários perfis para evitar fadiga, promover conhecimento e cuidar do bem-estar emocional.
Este equilíbrio exige flexibilidade para experimentar e uma busca constante por qualidade literária e conexão com o que se lê. Ao invés de ficar criticando a leitura alheia, ou algum autor, porque não o conhece e participa de grupos de leituras para explorar outros horizontes?
No evento citado, duas autoras que saíram da bolha de seus leitores, causando um grande rebuliço nas redes, compartilham conosco suas experiências e reflexões durante a criação e até o momento:
Rafa e o universo do “Rexnaldo Rex Silvassauro”
Rafa Mezzi, autora de O CEO Dinossauro, veio de uma experiência no TikTok contando histórias do gênero monster romance, onde sua popularidade cresceu lendo narrativas sobre dinossauros evoluídos. Inicialmente, ela não sabia quando a ideia do livro nasceu, mas levou a sério o pedido de seus seguidores e criou um universo inteiro para esses personagens.
A autora sabia que seu livro geraria comentários controversos: “Eu já esperava furar a bolha... o gênero já sofre muito julgamento”. No entanto, Rafa continua as diversas críticas: “Eu não cometi nenhum crime escrevendo para entretenimento.” Para ela, o que sustenta o sucesso do livro é a criação de uma comunidade engajada desde o princípio, uma estratégia pensada que deu frutos. Ela explica: “A comunidade deve tomar força e é responsável pelo engajamento nas redes sociais.”
Por trás da aparente leveza do gênero monster romance, o livro de Rafa se revela uma obra com construção de universo e personagens complexos, que desafiam estereótipos e criam conexões emocionais fortíssimas com o público. Ela ainda reforça aos autores: “O julgamento existe independente do que você faz, não deixe que isso te impeça de publicar.”
Corine e a profundidade em “Nas Garras do Perigo”
Corine Gueniévre, autora de Nas Garras do Perigo (famoso como “Mafioso do Tigrinho”) e também autora dos livros publicados pelo Litera: Destinada ao inimigo e Dark Necessities, apresenta um trabalho que vai muito além do rótulo de um romance sobre crime organizado. Em sua pesquisa, ela mergulhou no fundo das estruturas reais da “máfia brasileira”, tráfico de drogas e jogos do bicho, explorando redes criminosas complexas e suas conexões internacionais que apareceram na mídia tradicional.
Ela revela: "Minha intenção foi mostrar realidades às quais poucas pessoas prestam atenção, indo além dos clichês. Há muito acontecendo nos bastidores que não aparecem nos jornais." A autora descreve uma percepção crescente de crimes ocultos e esquemas inexplorados que só foram evidenciados com maior força durante a pandemia e o crescimento das redes sociais, acrescentando complexidade à narrativa.
Mais que um romance, seu livro é uma investigação literária que denuncia e provoca reflexão sobre questões reais do Brasil, explorando as camadas do submundo com muita profundidade. Corine não esperava tamanho burburinho, relata que recebeu reações muito variadas, incluindo interpretações erradas e memes, o que evidencia a força inesperada da obra em atingir públicos diversos.
Para ela, o segredo de divulgação foi combinado com leveza no lançamento com provocações sutis nas redes sociais, apoio de equipes dedicadas e forte presença em plataformas como TikTok e Threads. Sua dica para autores é clara: “Fale do seu livro incessantemente, invista em marketing e prepare-se para o sucesso.”
O que esperar da leitura e do leitor?
De fato, as histórias possuem múltiplas camadas e significados, e cada uma das ofertas depende tanto da obra quanto do leitor, momento e interesse. Cada leitura é uma experiência legítima, que pode estimular, acolher, divertir e até te surpreender.
Contudo, isso destaca uma questão essencial: o gosto pessoal é uma experiência individual que não deve servir para julgar ou desmerecer a leitura alheia e até mesmo quem escreveu a obra. Respeitar às escolhas diversas é fundamental para manter um ambiente literário rico e inclusivo. O debate construtivo acontece quando feito com base em análise técnica e empatia, e não em preconceitos e seleção subjetiva.
Conclusão
A literatura é tanto um convite ao desconforto quanto um refúgio de prazer, e a melhor experiência de leitura com respeito e alternância desses papéis. Leitores e autores são chamados a abraçar essa multiplicidade, a buscar qualidade, a experimentar e a fortalecer um diálogo aberto que valorize todas as formas legítimas de ler e escrever.
Ao final, o que importa é que cada livro dialoga com o momento pessoal do leitor, aguçando interesses, promovendo o crescimento e preservando a paixão pela leitura.
E você, já deu oportunidade para algum livro sem julgar pelo título? Capa? Sinopse? Gênero? Você pode surpreender, como vimos duas autoras incríveis criaram um universo distintos, alcançaram uma comunidade e não tiveram medo de colocar essa ideia para o mundo. Tudo na base de pesquisa, profundidade e muito esforço, afinal, como disse a Rafa, ninguém cometeu um crime e você é livre para ler o que deseja só não menospreze sem conhecer, porque tudo tem um motivo e o momento exato.
Texto escrito por: Cass Razzini
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